Olá, meus queridos leitores,
Para a coluna de hoje, pensei em compartilhar com vocês um manifesto que escrevi no final do ano passado, quando tive a oportunidade de fazer um discurso num evento realizado na faculdade em que estudo. No texto abaixo, falo sobre a modernidade e como ela está sujeita a grandes conflitos (conflitos esse que estamos vivendo!). Falo sobre a egolatria das relações, as amizades por status e demais coisas que poderão conferir in loco.
Alguns dos autores que usei para escrever esse manifesto foi o livro “O homem que sabe”, de Viviane Mosé, filósofa e especialista em educação, sendo suas palestras que me ajudaram muito a construir esse texto, já que apontam exatamente o assunto proposto. Escrevo de uma forma simples, como um discurso falando, então, se conseguirem ouvir minha voz aí do outro lado não é mera coincidência. (Risos.)
Então é isso, espero que gostem do texto e que tire algum proveito para seu cotidiano. Não podemos mudar o mundo, mas toda vez que penso no macro eu volto pro micro, pois é cuidando do nosso entorno que está a grande questão.
A modernidade que vivemos hoje é resultado do acúmulo e construções que tivemos no decorrer da história. A nossa vida muda à medida que mudanças significativas acontecem na história. Mas a gente precisa começar de um ponto. Eu vou me arriscar nesse caminho. Para falar de onde tudo começou teria que falar de Homo Sapiens, o animal-homem dentro da caverna, mas a gente não tem tempo para isso. Vamos começar, por exemplo, na Grécia Arcaica, numa época em que o conhecimento era acumulado. Para que as pessoas tivessem conhecimentos tinham que recorrer ao livro Ilíada e Odisseia. Um livro que tinha filosofia, religião, medicina; tinha o mundo. Mas as pessoas não podiam levar aquele livro para casa porque não tinha o livro impresso, então, as pessoas decoravam o conhecimento adquirido na história, todos os ganhos, todas as descobertas.
Com a invenção da imprensa no século XV, Gutenberg possibilitou que todo conhecimento pudesse ser adquirido em casa. A invenção da imprensa cria-se o renascimento: e o que é o renascimento se não uma explosão de conteúdos e a abertura de uma nova possibilidade de vida? A democratização do acesso na Idade Média para o renascimento abriu uma nova porta. E, no meio desse caldo, nasceu um novo livro que disse: “Proletários do mundo uni-vos”.
Esse manifesto deu a possibilidade da classe popular conhecer. As classes populares queriam aprender a ler para ter acesso àquela liberdade que a burguesia dizia que tinha. Chegamos ao século XX com a consciência de que o saber é uma arma e que é mais potente e poderosa que as outras. Em compensação, o século XX foi marcado pela técnica. O homem investiu na técnica para ter controle sobre o homem e felizmente à tecnologia deu um passo maior do que nossa capacidade humana de elaborar. Entramos no século XXI com um novo modelo de pensar — ou que deveria.
Vivemos em um novo renascimento que possibilitou a explosão da consciência, mas que ainda baseia-se no modelo piramidal em que um manda e os outros obedecem. Estamos saindo de um raciocínio linear — criada pelo pensamento socrático, platônico e aristotélico — para viver em rede. Com a tecnologia as pessoas puderam ter acesso ao conteúdo produzido pela humanidade. Mas, como tudo na vida carrega seu contrário, o novo renascimento trouxe a exaustão, crise ambiental, crise econômica, crise política, crise em todas as esferas. Estamos todos perdidos e não sabemos qual rumo tomar.
Como não apontar o caos que estamos vivendo sem falar da escola, que é o centro da questão. Como disse Viviane Mosé: o modelo escolar que ainda predomina no Brasil foi marcado por dois grandes fatores: a industrialização tardia e o Regime Militar. Estamos em pleno século XXI e a escola brasileira ainda é fundamentada na memória. A revolução contemporânea tecnologia possibilitou viver melhor. O que é a revolução tecnológica se não deixar de acumular dados? Estamos todos libertos do acúmulo de dados e podemos pensar, sentir, criar, conviver, relacionar. Mas como, se o professor ainda se sente detentor do poder? Então, pergunto, o que estamos fazendo aqui senão compartilhar, trocar saberes e tentar de algum modo resgatar aquilo que se perdeu? A escola devia ser fundamentada na criatividade, na ousadia e na convivência. Mas não. O mundo inteiro está com dificuldade em educar. Com as novas mídias a escola devia a postar no modelo interpretativo, criar métodos de pesquisas para que as nossas crianças tenham cada vez mais camadas sobe si mesmas.
Como dizia Ruben Alves: educar é completar alma. Saber nenhum tem valor se não estiver vinculada a vida, as relações, as contradições, a existência. Educar, talvez, seja compreender as diferenças, conviver com o outro, entender que uma partícula está ligada a outra partícula e, que, portanto, faz de nós um inteiro. Não tem como mais investir na escola. Temos que destruir a escola. Não tem como dizer que o problema são os alunos. O problema está no todo, mas não fomos alfabetizados para enxergar esse todo.
Isso porque não comecei a falar sobre o ensino superior — que é mais enfadonho ainda. Aquilo que chamamos de adulto não passa de infantilização. Adultos que se dizem éticos, que dizem ter princípios, que dizem tantas coisas, cujo alvo é nítido: o ego. A egolatria ganhou tanta proporção que deixou as pessoas com uma viseira: de que adianta ser um engenheiro, ganhar seus 20 mil reais por mês, se vivermos numa sociedade de medíocres com dinheiro?
A universidade é mais horrorosa que a escola por escancarar a ganância e dar voz ao estético. A beleza de um trabalho é mais importante que o processo de criação e a convivência. O politicamente correto está tão presente nas relações que as pessoas fingem que ouvem uma as outras. O que é um amigo se não para depositar-lhe seus problemas, suas dificuldades, suas neuras? O “eu” tem que estar em evidência. O meu problema é maior que o seu, do colega, do não colega, inclusive. A minha má-relação com um garoto é mais significante que a dificuldade de um morador de rua pedindo esmola e um prato de comida.
A humanidade não consegue ver o tamanho da sua insignificância em meio há bilhões de pessoas e, por não enxergar o tamanho da sua insignificância, tornam-se prepotentes, arrogantes e zombeteiros. São homens e mulheres que atravessam os dias num ciclo vicioso em querer se enquadrar, ora, perder as referências não é tão ruim assim... A competitividade é mais grandioso que trabalhar em coletividade. Já não somos tolerantes sobre as opiniões contrárias, sobre as escolhas contrárias, não somos tolerantes para mais nada, apenas excluímos um aos outros. Intuo que isso tudo se dê, também, pelo fato de sentarmos todos em fileiras em sala de aula.
Mas a vida não é uma fileira. Há desafios para todos os lados, há jogos para todos os lados. Somos adultos que não conseguem admitir as birras, as manhas, a fraqueza. Somos uns tolos. Perdemos as referências: não sabemos quem somos, o buscamos, para onde vamos. Já não sabemos lidar com a tristeza, com a solidão, com a perda, com o fracasso, com a frustração. O caos que vivemos hoje é fruto da ignorância.
E assim vamos vivendo, dia após dia, olhando para o umbigo e fechado para o mundo. Até o momento que seremos engolidos pela crise ambiental. E só então vamos dar conta do tamanho da insignificância que somos todos. Porém, tarde demais. Não haverá cerveja no fim da tarde. Não haverá mais nada porque tudo será engolido por uma catástrofe gerada por nós mesmos. Não haverá sociedade tampouco história para se contar. Não haverá existência.
O que pouco se considera é que a crise ambiental é o nosso problema e a solução. Nosso problema porque ela destrói e a nossa solução porque nos unem. Ou a humanidade repense sobre o que tem feito ou não haverá vida. Ou repensamos nossas atitudes ou não haverá discurso sobre a vida. A vida adoeceu: o grande desafio agora é curá-la.
Oi Leandro!
ResponderExcluirTudo bem? Achei o seu texto muito interessante principalmente por abordar a crise na educação pela qual estamos passando. Se por um lado a reforma do currículo básico da educação é necessário pois ele não atende as necessidades do estudante, por outro o fato de que o novo modelo é bom apenas na teoria não faz sentido a mudança.
Acredito que antes de mexer no currículo é preciso dar infraestrutura as milhares de escolas sucateadas pelo Brasil a fora, precisa-se antes mudar a maneira robótica como os professores ensinam e já que estamos falando neles é necessário que a classe possua mais condições, mais investimentos e mais incentivos. Num país onde o professor é desrespeitado de praticamente todas as formas eu realmente acredito que o importante mesmo é uma mudança mais profunda que apenas as matérias ensinada.
Beijinhos - Jessie
www.paraisoliterario.com
Jesse, adorei ler seu comentário. Me deu uma esperança que havia se perdido nesse súltimos dias. Todas as coisas se renovam constantemente,no entanto, a escola continua defasada, sem perspectiva, sem rumo. Concordo com tudo que disse. Obrigado pelo comentário. Um forte abraço.
ExcluirÓtimo texto. Acredito que o conhecimento sempre foi a grande arma da humanidade, voltada para o bem e para o mal de todas as formas e as pessoas as usaram para muitas coisas, tanto que hoje o mundo é influenciado por isto, senão o homem se torna ignorante dentro de uma sociedade que
ResponderExcluirjulga o tempo todo.
Beijos,
Greice Negrini
Blogando Livros
www.blogandolivros.com
Greice,sábia as suas palavras. Obrigado pelo carinho. Um super beijo.
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