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[FRANCA MENTE] O DOMÍNIO DO TEMPO

Por Francine S. C. Camargo •
domingo, 23 de junho de 2019


Essa história é sobre um Relógio que trabalhava as 24 horas do dia em ritmo alucinante, sequer respirava e não pronunciava nenhuma outra frase que não fosse o tal do tic tac desenfreado, horas a fio. Cansava, sim. Mas parar não parava, com medo de atraso, medo de que qualquer distração pudesse embaraçar suas atividades.

Entre tanto tic e tac, até pensava um pouco nas contas a pagar, nas viagens por fazer, nos Reloginhos crescendo, na Relógia mãe, que mal encontrava, mas que compreendia seu encargo. Sim, pois era para um bem maior, era uma grande causa, era simplesmente para...

Para...para o quê mesmo? Esquecera ainda agorinha qual era sua motivação. Mas espere, haveria de lembrar-se, como chamava mesmo a sua explicação, o seu motor? Era algo como disciplina do espaço, não, não, não, tinha a ver com monitoramento dos sentidos, ou não era bem isso...rotina, talvez. Sim, claro, claro, como pôde bloquear as palavras! A justificativa para não estagnar os ponteiros era o controle do tempo.

Muito bem, então. Controle do tempo. Mas, já lamentando pela próxima pergunta, controle do tempo de quem e para quê? Ora, essa era mais simples, respondeu o Relógio, o tempo pertence aos homens, eles precisam dele para trilhar seus destinos, planejar seus objetivos, atingir seus desígnios.

Ótima resposta, decoradinha. Só sobrou uma pequena dúvida: o homem tem o controle do tempo? O tempo pertence aos homens? E se não, a quem cabe o tempo?

Anos e anos nessa lida, pontualmente, com ritmo marcado, concentração fiel ali na agulha, para agora descobrir que ninguém é dono do tempo e que ele se encerra em si mesmo. E que, para ser um pouco mais rigoroso, são as horas que dominam o homem.

Chega, então. Hora de descanso. E, nesse instante, curto ou longo, já não sabemos mais, o Relógio parou de trabalhar, concluiu sua atividade naquele dia, guardou os ponteiros na bolsa, dispôs o chapéu na cabeça e foi embora para casa.

Em seu percurso, observou cuidadoso quem passava por ele. Alguns perdidos, correndo, outros consternados, a olhar para o pulso, para todos os lados, sem nada entender. Muitos gritavam, apressados, ofendendo quem atrapalhasse a passagem, outros andavam em passos lentos, muito mais vagarosos que o normal, por acharem que tempo lhes sobrava.

Apertou um pouco mais o passo diante dessa crescente desordem. Sabia que o estariam esperando, sua família, como o faziam todos os dias, sem recompensa. Hoje eles a teriam. Sem exteriorizar as palavras, decidiu que em alguns dias retornaria a seu posto. Por ora, iria relaxar. Sem pressa.



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