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EU NÃO SABIA

Por Leandro Salgentelli •
sábado, 1 de junho de 2019


Eu não sabia que doeria tanto, que doeria mais do que se possa imaginar.

Eu sabia que uma hora iria acontecer, mas não esperava que fosse tão logo. Que fosse acontecer numa quinta-feira fim de tarde. Ainda tenho uma visão embaraçada do que aconteceu. Estávamos sintonizados, as coisas estavam fluindo e de uma hora pra outra tudo mudou.

Não chegamos a atravessar um inverno, mas naquele instante abriu-se dentro de mim uma dor involuntária. Depois do abraço que durou mais que todos os outros, entrei no Uber avariado, sem saber o que dizer, o que pensar, o que sentir. Então a motorista me avistou pelo retrovisor e perguntou se eu estava bem.  

Eu não sabia que daquele instante em diante teria que lidar com o abandono.  

Comecei a chorar a ponto de perder a fala, e enquanto tentava me acalmar no trânsito daquela tarde, eu chorava ainda mais. Ela havia sido durante todo o trajeto um estranho conhecido, ora, parecia que alguém realmente estava preocupado com o meu sofrimento. Aposto que se fosse qualquer outra pessoa no volante minha reação seria outra. Penso que sentir tornou-se proibido nesse mundo de arranha-céus...

Eu chorava de uma dor que não compreendia, de uma tristeza que beirava o absoluto. A semana havia começado esquisita, mas não imaginava que terminaria num vazio de domingo à tarde.

Ela havia me deixado na porta de casa, mas como entrar se eu teria que falar de uma dor que mal sabia explicar? Então fui à casa de uma amiga que acolheu meu desespero. Ela abriu a porta com um abraço mais afetuoso do mundo. Que estranho, mais alguém que compreendia meu sofrimento. Eu buscava na memória recente palavras para compreender o que havia acontecido meia hora antes. Eu fui emendando um acontecimento no outro e já não sabia se estava fazendo sentido.

Eu não sabia que as lembranças chegariam tão cedo.

Horas depois voltei pra casa, sentei no sofá, no mesmo lugar em que havíamos dado as mãos, e chorei mais um pouco. Fui pro quarto, deitei na cama que também havia conhecido nos corpos, e novamente, tudo voltou à tona.

Eu não sabia que ficaria fora de mim.

Nunca havia me sentido tão desamparado na minha própria solidão. Eu chorava de uma dor que não compreendia. Sentia uma tristeza que me doía o corpo todo. Naquela noite chorei tanto que a única maneira para amenizar a minha dor era dormindo. Apaguei.

Eu não sabia que teria o depois.

Eu não sabia que os dias se tornariam mais compridos a ponto de procurar tarefa para fugir do pensamento. Eu não sabia que teria que frear as lágrimas quando fui a lugares em que passamos tantas vezes juntos. Eu não sabia que ao ouvir uma música teria que conter a emoção.

Eu não sabia... Eu não sabia lidar com o vazio que se estabeleceu.

Ainda não sei lidar com o silêncio melancólico. Com as luzes apagadas. Com o tempo nublado. E também não sei como será o amanhã.

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