Destaques

[CRÔNICA] EU NÃO TENHO QUE NADA

Por Francine S. C. Camargo •
domingo, 7 de abril de 2019

“Você tem que me fazer um juramento
De só ter um pensamento
Ser só minha até morrer.”
(Grande Vinícius)


Minha namorada é uma canção da música popular brasileira que me toca profundamente: a melodia delicada, a voz de Vinícius cortejando meus ouvidos, a súplica por amor e presença...isso é inigualável! Entretanto, peço perdão ao poetinha, com todo o respeito que dedico aos seus colóquios e rimas...mas EU NÃO TENHO QUE NADA!

Eu não tenho que jurar sobre quais são meus pensamentos, pois minha mente é fluida, pássaro rebelde que adora voar alto, muitas vezes nem a mim dá notícias, por qual razão a você deveria dar satisfação?

Eu não tenho que ser só sua, nem de mais ninguém, porque me interessa ser de mim. Serei sim para os outros, sem começo ou fim, mas sem posse, fico onde estou porque quero ou porque gosto ou porque me caibo bem nesse espaço, não por pertencer.

Logo eu não tenho que ir com você em seu caminho, seja triste ou um tanto feliz, mas irei onde meus pés alcançarem; os meus olhos estarão vagando, imersos em curiosidades multíplices, buscando novas matizes; os meus braços podem hoje ser ninho, amanhã ventania, já que outrora arderam em chamas enquanto gritei por socorro.

Mas nada tenho que.

Não tenho que gostar de rosa e não tenho que me vestir de princesa. Não tenho que entrar no vestido e nem ser gostosa, nem magra, nem capa de revista. Não tenho que saber andar de salto alto, nem que manter em cima do salto. Não tenho que dizer o que você quer ouvir. Não tenho que dizer sim se não estiver a fim. Não tenho que esperar pelo segundo encontro. Não tenho que sabotar o meu prazer. Não tenho que deixar os cabelos crescerem para jogá-los ao vento, nem de mantê-los curtos para ser reconhecida. Não tenho que ficar de cara lavada para ser natural, nem passar batom para me sentir feminina. Não tenho que pintar a unha para ser colorida, não tenho que ter uma versão em preto e branco. Não tenho que responder todas as mensagens se não tiver conteúdo. Não tenho que provar que mudei. Não tenho que continuar sendo a mesma. Não tenho que ser quem você espera que eu seja. Não tenho que me calar para não gritar. Não tenho que reclamar, nem usar o mesmo discurso para me encaixar. Não tenho que colecionar etiquetas. Não tenho que ser A ou B, não tenho que não ser AB. Não tenho que ganhar competições, não tenho que me esconder em pseudônimos. Não tenho que erigir muros ao redor de mim e não tenho que manter minhas portas abertas. Não tenho que ter respostas, não tenho que fingir que não há perguntas. Não tenho que ter fé e não tenho que ser cética por ser isso o esperado de mim. Não tenho que sorrir nas fotos e não tenho que chorar se sentir dor. Não tenho que contar os meus segredos, não tenho que decodificar mentes perturbadas. Não tenho que ter razão, não tenho que ser comum, não tenho que ter previsão de melhora. Não tenho que absolutamente nada.

Mas estrela posso ser, caro poeta, pois vivo facilmente na imensidão. Mas serei estrela dentro do meu infinito, onde nem preciso estar se não quiser. Pois não tenho tempo, nem ânimo e nem vontade alguma em “ter que” alguma coisa.

Comentários via Facebook

0 comentários:

Postar um comentário

Deixe sua opinião para nós do Refúgio Literário

Publicidade

iunique studio criativo

Instagram

    © Refúgio Literário – In Livros