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POR QUE, AMOR?

Por Suellen Mendes •
segunda-feira, 13 de novembro de 2017

 Olá, queridos refugiados!!! Como estão?
 Meus amores, é uma alegria poder estar aqui com vocês na Coluna Prosas nas Entrelinhas. Como já sabem, a minha adorada amiga Mai Passos e eu estaremos dividindo esta coluna todas às segundas. E nesta semana, adoraria poder compartilhar com vocês o meu mais novo projeto literário: A Coletânea "Por que, amor?", publicada pela nossa parceira Darda Editora. A Darda é uma de minhas editoras desde maio deste ano, e ao longo dos últimos meses já realizamos inúmeros projetos juntos - desde coletâneas aos meus livros independentes - No Cair da Noite... (poemas), Tioca e Marcelinha (ambos infantis) e Christmas Dreams (contos).

 A Coletânea Por que, amor? conta com nove contos, sendo oito deles escritos por talentosas autoras das mais diversas regiões do país selecionadas a partir do edital divulgado em setembro deste ano.

 O nono conto foi escrito por mim, e agora o divido com vocês. Querem conhecer um pouquinho deste trabalho que está aquecendo o meu coração? Então não deixe de conferir "Por que, amor?".

POR QUE, AMOR?
(Suellen Mendes)

 Era para ser o dia mais perfeito de minha vida, o mais alegre, aquele que me encheria de esperanças, afinal, hoje estou dando início a uma nova e importante fase de minha vida. No entanto, a umidade em meu rosto prova-me o contrário.

 Toco o vidro frio da janela. Do lado de fora, o belo jardim dos Nóbrega é regado pela tempestade que deságua dos céus. Mais uma vez a natureza parece espelhar o meu coração, como se estivéssemos conectados por algo que vai muito além do que o fato de convivermos em um mesmo espaço e tempo. Tornamo-nos irmãs. Confidentes. Foi nos braços fortes de suas folhagens, entre árvores e rochas que me entreguei a ele, à minha verdadeira metade. Sob um céu iluminado, a cumplicidade dos raios solares aqueceu minha pele desnudada pelas carícias em meio a ávidos beijos e juras de amor.

 Juras jamais cumpridas!

 Uma tola, eu sei. Como pude acreditar em suas falsas promessas? Foi realmente a ingenuidade que me fez acreditar que ele estaria disposto a lutar por mim? Por que não questionei, não racionalizei? É lógico que Marcos não o confrontaria. Nunca trairia o irmão roubando-lhe a noiva há anos prometida... Mas, então, por que me desgraçar desse jeito? Por que me seduzir com palavras gentis e sedutoras sabendo que dali a pouco tempo eu estaria casada com o mais velho de seus irmãos?

 A angústia não me deixava. Ao encarar o espelho mal reconhecia a imagem diante de mim. Esguia, um pouco magra demais, quase inadequada para ser mãe. Quase. Em breve não poderia mais ocultar a verdade recém-descoberta: grávida, esta era agora minha nova condição. Desgraçada! Uma vergonha para a sociedade de minha época e de qualquer outra. Como justificaria ao futuro barão a ausência de sangramento ao ser tomada por ele como sua esposa esta noite?

 Por anos fui preparada para o meu novo papel: uma nobre. A esposa do herdeiro do baronato, futura baronesa. Mas, agora tudo o que me resta é a vergonha de saber que por amor, este contraditório, egoísta e voluntarioso sentimento, decepcionei a todos: aos meus pais, aos meus futuros sogro e sogra, aos meus cunhados e ao meu futuro marido.

 Em minha mente tudo o que via era a imagem de Marcos indo embora, dizendo-me que o que fizemos foi um erro e que nunca mais poderíamos cometê-lo.

 Só conseguia chorar pelas lembranças. O rosto alvo, quase pálido, tornara-se, enfim, corado. As íris castanhas encontravam-se pintadas em uma tela carmesim; enquanto a alvura do imaculado vestido zombava de mim.

 Uma batida na porta.

 Quem poderia ser? Talvez a ama querendo me ajudar com os preparativos finais.

 - Só um momento! – pedi enquanto tentava disfarçar as marcas de meu sofrimento com o pó de arroz.
 - Por favor, Ester, abra a porta!

 Aquela voz! O que ele queria agora? Será que já não bastava todo o mal que havia me feito?

 - Marcos, vá embora! – tentei manter a voz firme, ao ficar de encontro à porta.
 - Minha flor, não me peça isso! Precisamos conversar...
 - Não temos mais nada a dizer... – percebi minha voz fraquejar ao sentir reverberar em mim sua voz me chamando de modo tão carinhoso. Eram ecos de memórias traidoras, amargas e doces, que jamais seriam esquecidas.
 - Tenha piedade de mim. – Minha voz era quase um sussurro ao encostar minha mão e testa contra a áspera madeira de mogno.
 - Amor, eu sinto muito. Não posso mais fingir que não me importo! Eu te amo, Ester, e não faz diferença para mim se você é noiva do meu irmão mais velho ou do próprio rei. És minha! E sempre serás!

 Havia tanta determinação em sua voz... Ele estava dizendo-me exatamente o que eu queria ouvir, o que eu precisava ouvir.

 Tomei um último fôlego e girei a chave.

 Assim que abri a porta, Marcos adentrou meu quarto. Sua aparência estava tão devastada quanto a minha. Não nos víamos há pouco mais de um mês, ele nem imaginava o fato de que seria pai em breve. Seu rosto sempre liso, maculado apenas pela cicatriz que ia da lateral direita de sua testa em direção à bochecha, fruto de uma batalha travada com um de seus irmãos na infância, durante um treinamento, estava agora coberto por pelos dourados de sua barba por fazer. Mas, mesmo assim, era lindo. O típico filho de um nobre; arrancaria suspiros ao chegar aos bailes em que as jovens eram apresentadas à sociedade. Falo com propriedade, pois foi exatamente assim que me senti ao vê-lo pela primeira vez há pouco mais de sete meses. Eduardo, meu noivo, é muito bonito; mas sua austera aparência não me causava o mesmo encanto que a de seu irmão caçula.

 Tirando-me de meu devaneio, Marcos tomou-me em seus braços, depositando beijos de adoração por todo o meu rosto.

 - Não chores, meu amor – implorava enquanto continuava sua adoração agora em direção ao meu pescoço, arrancando-me suspiros ao sentir o toque de seus lábios provocantes e desesperados.
 - O que é isso?! – A voz de Eduardo reverberava tal qual a ira de um trovão. – Que pouca vergonha é essa?! – questionou arrancando-me sem nenhuma gentileza dos braços de Marcos.

 Pela forma como me puxava para perto de si, sentia-me uma verdadeira marionete, seguindo apenas os seus comandos.

 - Solte-a, irmão! – Marcos ordenou, mas foi facilmente ignorado; então ameaçou: - Se não a soltar, eu mesmo o obrigarei a fazê-lo.
 - Então é assim, Marcos? Finalmente vais criar coragem e portar-se como um homem?

 A ira de Marcos era palpável ao ouvir as provocações do irmão. Eduardo puxou-me ainda mais para junto de si.

 - Sempre cobiçastes o que é meu, não é mesmo? Só que ela, irmão, nunca será sua! Ester casará comigo esta tarde, gerará meus filhos, será minha baronesa e não há nada que possas fazer.

 Percebi que Marcos estava absorto em meio às palavras do irmão a quem sempre admirou. Quanto a mim, não conseguia acreditar em tudo o que estava ouvindo. Como Eduardo poderia ser tão frio? Em nada lembrava o homem que vinha me cortejando nos últimos meses... Definitivamente não era isso o que queria para a minha vida, não estava disposta a passar o resto dos meus dias ao lado de alguém que me tratasse como um objeto decorativo cuja única função seria gerar os seus filhos.

 - Estou grávida! – falei sem ao menos ponderar as consequências daquela declaração. Já não havia mais volta, todos os segredos seriam revelados.

 O olhar de Marcos deixou os do irmão e direcionou-se para mim, os olhos arregalados agora se baixavam e admiravam atentamente o meu ventre. Eduardo espelhou o gesto. Ambos os irmãos, por fim, se encararam.

 - O que fizestes? – Eduardo questionou: - POR QUE ME TRAIU DESSE JEITO?! DESONRASTES A MIM E À NOSSA FAMÍLIA!!!
 - Eu a amo, irmão! – foi tudo o que conseguiu dizer.
 - Ama?! – Eduardo perguntou como se aquela simples declaração de Marcos houvesse pressionado um pequeno botão dentro de si, acalmando-o de um modo que jamais pensei ser possível.
 - Amo. E não deixarei que a tires de mim. – Marcos estendeu sua mão e eu a segurei, aproximando-me dele, escorregando pelos dedos de Eduardo. – Cuidarei dela e do nosso filho – declarou assim que cheguei aos seus braços.

 Ao ouvi-lo, me senti plena, repleta de amor e esperança. A esperança de uma vida ao lado do homem a quem amo. Finalmente as coisas começavam a fazer sentido para mim. Ao olhar em direção à janela, a tempestade era finda, e assim como os primeiros raios iluminavam as árvores, após a escuridão, senti-me iluminar por meus sentimentos.

 - Seria ridículo perguntar o que sentes, não é mesmo? – Meu noivo encarou-me agora com uma serenidade que em nada lembrava o possesso homem de minutos atrás.
 - Tudo o que fiz foi por amor – respondi-lhe mesmo assim.
 - Por que, amor? Juro que gostaria de compreender por que sempre nos leva ao extremo, sem de fato oferecer-nos verdadeiro conforto. – Eduardo estava envolvido em suas questões, porém instantes depois voltou a nos dedicar atenção.
 - Eu também já amei - começou a contar. – Muito. E também fui amado. Mas, assim como vocês, não pude viver este sentimento sem levar em consideração suas consequências. Tornei-me amargurado e desesperançado depois que decidi deixar essa história de amor no passado; até que te conheci, Ester: a minha prometida, a quem nunca havia visto, mas com quem tinha obrigação. Veja bem, não lhe culpo pelo que fez, na verdade, lhe entendo. Agora lhe darei uma escolha, assim como pude fazer a minha: podes renunciar ao nosso compromisso, arcar com as consequências do escândalo que tal atitude lhe custará e ficar com quem você ama; ou, podemos seguir com o nosso destino: caso-me com você e assumo o filho que estás carregando como se fosse meu, prometo deixar esse infortúnio no passado e nunca mais voltar a este momento.
 Eu não estava acreditando no que Eduardo estava me propondo, cada palavra era como o atar de grilhões em meus pés, prendendo-me. Não havia escolha fácil, em ambos os casos haveria consequências, restava-me apenas decidir qual delas eu estava disposta a carregar. Senti as mãos de Marcos me abandonarem e imediatamente soube qual deveria ser a minha resposta:

 - Eu aceito.

 O pesar no rosto do meu amado era nítido.

 - Eu aceito as consequências de minha decisão - continuei. – Renuncio a você e ao seu título, em troca escolho as intempéries do verdadeiro amor.

 A forte luminosidade que adentrava as janelas só não era mais radiante do que o sorriso de Marcos. A forma como ele gargalhava ao me pegar pelo colo e me girar só comprovava que eu havia feito a escolha certa.

 - Imaginei que seria essa a sua decisão, Ester – comentou Eduardo com um pequeno sorriso. - Agora venham, tem uma festa de casamento preparada no salão, acredito que uma troca de noivos não venha a ser um grande problema.

 De encontro aos meus lábios, Marcos sussurrou: - Para mim, será a solução. – Então me beijou.

 Dávamos início ali ao primeiro capítulo do resto de nossas vidas.

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